“A injustiça que se faz a um é uma ameaça que se faz a todos”.Charles-Louis de Secondat (Barão de Montesquieu).
Por maioria, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, no Recurso Especial nº 1.869.720-DF[1], pela inadmissibilidade de penhora de ativos financeiros da conta bancária pessoal de cônjuge não integrante da relação processual, nos termos do voto apresentado pelo Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, em 27 de abril do corrente ano.
A celeuma que deu origem a decisão da 3ª Turma do STJ nasce do caso concreto onde, em fase de cumprimento de sentença, a parte autora propugnou pela penhora dos ativos financeiros contidos em conta pessoal do cônjuge da parte ré, como meio de recebimento dos valores do título executivo.
O argumento central da parte autora para a consecução da pretensão era baseado, principalmente, no regime de bens que vigoraria na vida matrimonial do casal em tela – regime de comunhão parcial de bens – e, por consequência, na provável responsabilidade solidária em que o cônjuge estaria ligado, “automaticamente”, em relação às obrigações contraídas pelo parceiro.
No mérito, o argumento foi rechaçado por imperativas razões jurídicas: “[…] o regime de bens adotado pelo casal não torna o cônjuge solidariamente responsável de forma automática por todas as obrigações contraídas pelo parceiro (por força das inúmeras exceções legais contidas nos arts. 1.659 a 1.666 do Código Civil)”.
A razão que assiste a tese da Corte Superior fundamenta-se, além do exposto, na impossibilidade de imputar ônus extremamente gravoso à terceiro que, sequer, participou do processo de conhecimento da ação. Assim, não faria sentido a contrição de ativos da conta pessoal de parceiro que não gerou qualquer elemento, suficientemente consistente, para efetivação de justa contrição.
Fica claro, portanto, que aquilo que orbita na zona estritamente pessoal de um dos cônjuges não pode servir como “fundo emergencial” para contrição alheia, oriunda de obrigações personalíssimas criadas pelo outro parceiro.
Essa cognição afasta a confusão que se ventilou no referido recurso de que, “automaticamente”, a reponsabilidade de saldar a dívida incidiria, supletivamente, em face do núcleo familiar – onde figura o outro parceiro – e não, necessariamente, ao individual originalmente responsável.
Nesta lógica, evita-se verdadeira saga processual por parte do outro parceiro, por meio de embargos de terceiro, na busca de realizar prova negativa para deslegitimar a situação em tela, efetivando-se, deste modo, tanto os direitos e deveres das distintas pessoas, quanto do núcleo familiar, auferindo, por fim, dentro dos limites possíveis e da verdade do processo, a efetividade da mais lídima Justiça.
Alexandre Targino, estagiário do ASBA Advogados Associados.
[1] STJ – REsp: 1.869.720 DF 2019/0370639-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 27/04/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/05/2021. Disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=%28RESP.clas.+e+%40num%3D%2218 69720%22%29+ou+%28RESP+adj+%221869720%22%29.suce.> ou <https://stj.jusbrasil.com.br/juris prudencia/1207719536/recurso-especial-resp-1869720-df-2019-0370639-7/inteiro-teor-1207719598>. Acesso em: 28 set. 2021.